A campanha agosto dourado incentiva o aleitamento materno e o dourado remete a cor, que por sua vez, está relacionada ao padrão ouro de qualidade do leite materno. A iniciativa é de extrema importância, porém é preciso ir além e também incluir nas campanhas mães que amamentam crianças com alergias alimentares, pois em alguns casos, essas mães ao receberem o diagnóstico de seus filhos, precisam restringir o alimento alergênico de sua dieta para continuarem amamentando.
De acordo com o ministério da saúde, o leite materno é um alimento completo. Isso significa que, até os 6 meses, o bebê não precisa de nenhum outro alimento (chá, suco, água ou outro leite).
Segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia – ASBAI, amamentar pode evitar que a criança desenvolva alergias, principalmente as alimentares.
Sabe-se que o leite materno é fator protetivo para diversas doenças, por isso campanhas como Agosto Dourado são muito importantes, porém é preciso ir muito além das orientações para gestantes e nutrizes em geral. Fala-se muito de rede de apoio, portanto, é crucial formar e fortalecer essa rede ainda antes da chegada do bebê para que essa mãe se sinta acolhida e amparada, tendo o suporte necessário para atravessar o puerpério, que é uma fase cheia de desafios, como também para descansar e se alimentar adequadamente e assim amamentar o bebê, que vai depender totalmente da mãe para se alimentar e consequentemente se desenvolver de forma saudável.
O puerpério ou resguardo, é a fase pós parto, ou seja a mulher já passou por diversas modificações durante a gestação e nessa nova fase passa por outras, incluindo alterações hormonais, físicas, psíquicas e emocionais, além de ter um bebê totalmente dependente de seus cuidados, daí a necessidade da rede de apoio. Junte a tudo isso, um bebê ainda em aleitamento materno que recebe o diagnóstico de alergia alimentar.
É possível continuar amamentando? É necessário a mãe fazer restrição alimentar para amamentar o bebê alérgico?
Para a primeira pergunta, a resposta é sim. Para a segunda, depende, pois há casos e casos. Somente um médico especialista pode fazer o diagnóstico de alergia alimentar, que não é fácil, pelo contrário, é muito complexo e deve começar a partir de uma escuta atenta do relato dos pais e/ou cuidadores, sendo na maioria das vezes, a mãe que vai perceber inicialmente os sintomas no bebê. Após essa escuta, exame clínico, acompanhamento periódico e se necessário, testes complementares, é que o médico vai orientar se a mãe precisará ou não fazer restrição da proteína alergênica para continuar amamento. Vale ressaltar que o tratamento de alergia alimentar é individualizado, pois os sintomas e reações podem variar muito de um indivíduo para outro.
“Desde ela bem bebê eu sentia que algo não estava certo, suas cólicas começaram mais cedo, entre os seus primeiros 30 dias de vida e eram muito intensas. Além das cólicas, Amelie sempre apresentou um refluxo exagerado, era comum ficarmos com ela no colo praticamente o dia todo, pois era muito difícil deitar ela em qualquer lugar sem que ela regurgitasse. As noites também seguiam intensas, na qual ela acordava praticamente de hora em hora chorando muito.
É importante eu compartilhar que além do puerpério, da quase mastite e da privação imensa de sono, teve a peregrinação médica. Nesse meio tempo visitei dermatologistas diversas vezes, gastropediatra, nutricionistas e ninguém foi capaz de sugerir um quadro de alergia. Um fato que eu achava intrigante, é que algumas vezes que ela mamava, o seu corpinho ficava cheio de urticária e logo passava, mas me disseram que poderia ser pelo esforço que ela fazia para mamar, que no caso não seria uma urticária, mas sim o aumento do fluxo sanguíneo no local.” Laurise Arruda
Em situações que a mãe precise fazer restrição alimentar para continuar amamentando, certamente todos os desafios do puerpério e do aleitamento materno se intensificam, pois além de tudo, ela vai precisar de ajuda de um profissional nutricionista para orientar na substituição de alimentos para que não aconteça um déficit nutricional e assim o leite materno continue rico em nutrientes que garantam o bem estar do bebê.
“A amamentação sempre foi muito importante. Tivemos o diagnóstico por volta dos 5 meses. Desde então restringimos o leite e depois de um mês o ovo. Amamentei-o até os 2anos e 3 meses sem poder ainda ingerir esses alimentos. Se fosse necessário faria tudo novamente.” Andressa Viegas
No entanto, fazer adaptações na rotina alimentar não é o principal desafio, uma vez que, essa mãe provavelmente vai precisar lidar com a ausência de informação e conscientização sobre alergia alimentar por parte de familiares, amigos e sociedade em geral.
“Meu marido achava que eu estava ficando paranoica, meus pais diziam que eu estava sofrendo à toa, que ela estava bem, normal, e como não havia uma melhora de nem 70% eu acabava voltando a consumir leite e derivados normalmente, mas a felicidade durava pouco. Depois, já com o diagnóstico da alergia a proteína do leite de vaca e do ovo, eu já nem saia muito de casa, não trabalhava, minha faculdade estava trancada, por isso perdi contato com grande parte dos meus amigos porque eu sempre estava tensa demais pra manter diálogos, me afastei de verdade. Não podia ir em reuniões, festinhas e afins sem me sentir péssima.” Laurise Arruda
Mediante o depoimento acima, é possível deduzir que os impactos de um diagnóstico de alergia alimentar de um bebê em aleitamento materno vão muito além da alimentação, a mãe que já está em um momento de fragilidade, descobre que um ou alguns alimentos que come estão fazendo mal para seu filho através do leite materno, e mediante a necessidade de se submeter a uma dieta restritiva, se vê privada de comer alimentos que até então faziam parte da rotina e que agradavam o paladar, além de ter que lidar com a incompreensão de muitos a sua volta, inclusive precisando pausar atividades, como aconteceu com a Laurise.
Comprovadamente é necessário ir além nas campanhas, como Agosto dourado, além do incentivo ao aleitamento materno, é preciso também incluir o tema: Aleitamento materno & Alergia Alimentar! É possível conciliar! Porém, não basta a mãe ser consciente e determinada a fazer a restrição que for necessária para amamentar seu filho, é preciso informar e conscientizar a sociedade para o acolhimento e inclusão dessa mãe, que na maioria das vezes, se isola por falta de opção.
Amamentei meu primeiro filho APLV até três anos. Uma experiência incrível porém desafiadora, saber que o bem estar dele depende só de mim, torna a responsabilidade um fardo. Hoje com o segundo filho com quatro meses também APLV, falar que o caminho é mais fácil, não seria a palavra, pois temos a consciência correta das consequências em não cumprir de forma rigorosa a dieta. Uma rede de apoio é fundamental. Priscila Milani
APLV é a sigla para Alergia a Proteína do Leite de Vaca, a alergia alimentar mais prevalente em crianças.
Segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia – ASBAI, casos de alergia alimentar crescem em todo o planeta. Existe uma lista de oito principais alimentos alergênicos: leite, ovo, soja, trigo, amendoim, castanhas, peixes e frutos do mar. No entanto, vários outros alimentos vêm paulatinamente ocupando espaço nessa lista, caso das sementes (destaque para o gergelim) e algumas frutas. A frequência de alergia a amendoim e castanhas aumentou entre a população pediátrica nos últimos anos.
Ainda de acordo com a ASBAI, No Brasil não há estatísticas oficiais, porém, a prevalência parece se assemelha com a literatura internacional, que mostra cerca de 8% das crianças, com até dois anos de idade, e 2% dos adultos com algum tipo de alergia alimentar.